Por que sua escola precisa parar de ter medo das redes sociais

Colunas

Marcela Lorenzoni fala sobre o protagonismo do estudante, focando em como sua escola precisa parar de ter medo das redes sociais. Confira!

Existe uma percepção generalizada de que “os jovens de hoje não ligam para nada”. De que perdem todo o seu tempo consumindo bobagens na internet. É um receio que escutamos de famílias, educadores e dos próprios alunos
É verdade, a absorção de uma nova tecnologia exige mudanças culturais na escola, o que só se alcança com diálogo, formações e muita persistência. Os próprios jovens estão habituados a utilizar o alcance das redes para lazer, comunicação e relacionamentos… Não para estudos. Transformar essa mentalidade leva tempo, mas é um trabalho que estamos fazendo em parceria com a comunidade escolar.
Porém, engana-se quem pensa que todas as ações que se encaixam nesse espectro – lazer, comunicação e relacionamentos – devem ser sacrificadas em nome do aprendizado. Muito do que acontece nas redes é parte importante da socialização e construção de cidadania desses estudantes. Se não a percebemos, é porque estamos presos a um modelo estático que não corresponde mais à realidade; e pior, não nos capacitamos para orientar nossos jovens no desenvolvimento de sua autonomia em um mundo digital.

Como os estudantes atuais compreendem e interagem com a informação?

Quando entramos em uma sala de aula, queremos que aquele momento seja significativo. Fazemos isso sem entender, contudo, como nosso público-alvo estabelece relações com a informação. Ensinamos como éramos ensinados, não da forma como eles gostariam de aprender.
Veja bem, na Era Digital em que vivemos, a popularização da internet e seu potencial de interação geraram novas configurações de espaços públicos, de caráter mais participativo e democrático. Consequentemente, os jovens cidadãos que estamos formando, os nativos digitais, não se contentam com ingerir a informação proveniente de uma página de jornal: eles precisam reagir, curtir, comentar, compartilhar, remixar. Estar online permite que eles criem comunidades muito além de seu círculo de amizades, de acordo com interesses, crenças ou objetivos em comum. É dessa maneira que aprendem, é dessa maneira que se tornam protagonistas.
Outro fator relevante é que, conectados, eles possuem um vasto cardápio de temas, linguagens, mídias e percursos à disposição. A personalização passa a ser a regra – eu clico em um link, assisto a um vídeo, sou levado a um anúncio, descubro um perfil, leio um artigo. Enquanto isso, talvez um colega que tenha clicado no mesmo primeiro link faça um trajeto completamente distinto! Começamos a vislumbrar, então, porque a mesma aula para 30 alunos pode parecer uma experiência desconfortável e até atípica para eles.

Eles têm tudo à disposição, mas não querem nada com nada – será?

Tendo desenhado brevemente o comportamento do jovem do século 21 nos meios digitais, esbarramos com outro preconceito: o de que essa geração estaria menos interessada nos assuntos que julgamos importantes. Ou seja, eles têm de fato todos os recursos à sua disposição, no entanto os estariam utilizando de maneira fútil, superficial.
Essa suposição vai contra os resultados de pesquisas. Dentre elas, o estudo “O jovem brasileiro e o futuro do país” (do Núcleo de Tendências e Pesquisa da PUCRS, 2016), questionou mais de 1700 jovens para mapear a extensão de seus interesses. A primeira descoberta foi que 70% dos jovens afirmam que a política é algo próximo da sua realidade e do qual procuram se inteirar. Por outro lado, eles são menos compelidos a grandes temas globais e costumam se envolver com pautas com as quais se identificam em nível individual, como racismo, feminismo, os direitos da população LGBTQ+ ou a desigualdade social. Da amostra pesquisada, 60,7% disseram já ter se engajado em causas sociais por meio da internet – apenas 9,9% nunca se engajaram em qualquer causa, por falta de interesse.
Não é necessário olhar apenas para números quando temos exemplos ao nosso redor: recentemente, em 2016, estudantes de escolas públicas de todo o Brasil ocuparam seus colégios em resposta à Reforma do Ensino Médio e a PEC 55. Ou ainda, em fevereiro deste ano, estudantes estadunidenses se mobilizaram após um tiroteio em uma escola na Flórida, levando centenas às ruas pedindo por leis mais rígidas para o porte de armas no país. Eles estão interessados; apenas não no que estamos tentando ensinar.

Como educadores, precisamos aprender a despertar e direcionar esses interesses

Não existe receita de bolo no final desse artigo, um passo a passo para que sua turma se encontre subitamente apaixonada pelas aulas de biologia, literatura ou matemática. Cada escola busca e traça suas estratégias, seja através de uma Educação baseada em projetos ou na resolução de problemas, seja com aulas de robótica e Educação Digital, seja por meio de ações na comunidade em torno.
O que todas essas iniciativas devem ter em comum é a escuta ativa de seus estudantes – e a internet fornece o ambiente ideal para esse diálogo menos hierárquico, mais rico e democrático. Quando pensamos no uso intencional das redes sociais, mediado pela escola, a tecnologia se torna parceira, enquanto os professores são lideranças que orientam a participação dos alunos. Eles também, portanto, precisam se apropriar das ferramentas digitais, sendo capazes de educar cidadãos conscientes e protagonistas em um mundo conectado.
* Marcela Lorenzoni é especialista em Gestão da Educação no Novo Milênio pelo Instituto Singularidades e bacharel em Comunicação Social pela PUC-PR. Antes de entrar no universo de startups de tecnologia educacional, foi professora de inglês em escolas de idiomas, escolas particulares e no exterior. Hoje, é Consultora Pedagógica da Geekie. É apaixonada por protagonismo estudantil, tema que discutiu no ECOSOC Youth Forum, na sede da ONU em Nova York.
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