Neurociência: você sabe como seus alunos aprendem?

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Neurociência explica como jovens aprendem

Geração Y, millennials, nativos digitais. Há muitos nomes para se referir à geração de jovens que já nasceu imersa na internet, entre os anos 1980 e 2000. De acordo com a neurociência, há certas características comuns ao grupo: o imediatismo, a multitarefa, menor tempo de concentração, a adaptabilidade, a busca por uma relação estreita entre trabalho e lazer.

“As gerações anteriores tinham um tempo maior para a resolução de problemas. Antes, se você tivesse uma briga no colégio, você iria para casa – no máximo, falaria com a melhor amiga por telefone -, você dormia com esse problema e ele só seria enfrentado no dia seguinte”, explica a pedagoga e especialista em neurociência Kátia Chedid. “Hoje, o adolescente não só posta nas redes sociais sobre o conflito como transforma isso em uma ‘hecatombe mundial’, porque envolve conhecidos do mundo inteiro na discussão”, conclui.

Fica claro que o tipo de relacionamento que os nativos digitais têm com o mundo é bem diferente dos que vieram antes deles. A necessidade de processar um grande volume de informações influenciou as atitudes dos jovens não apenas quando conectados, mas também quando frequentam outros ambientes – como a escola, por exemplo.

Pode o migrante ensinar o nativo?

De acordo com a neurociência, migrantes digitais são todos aqueles que nasceram antes da década de 80 e, por consequência, tiveram que aprender a usar tecnologia ao longo da vida. Por definição, portanto, há hoje muitos migrantes digitais responsáveis pela aprendizagem de nativos digitais. O que surge do encontro entre essas gerações?

Para Kátia, a troca pode ser muito benéfica, especialmente em sala de aula. O professor, figura com mais experiência, é capaz de orientar os processos de aprendizagem; porém, também deve ter empatia e se manter aberto a inovações. “O migrante digital é capaz de fazer tudo o que se propuser a fazer”, garante a especialista. “Exige mais energia e exige sair da área de conforto, mas ele consegue usar a tecnologia como os nativos”.

“Como os nativos” é a chave. O que muitas escolas fazem, até hoje, é usar a ferramenta digital para substituir um instrumento pré-existente – instalar uma lousa digital para usá-la como quadro-negro, por exemplo, ou comprar um tablet por aluno para que ele termine sendo usado como caderno. É preciso encontrar abordagens em que a tecnologia complemente a proposta da escola, não a substitua: como a gamificação, a sala de aula invertida ou a aprendizagem personalizada.

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Infográfico: estações de aprendizagem na prática

Sem ditar fórmulas prontas, Kátia sugere que os educadores que procurem respostas com seus alunos. “Enquanto a gente achar que o protagonismo da sala de aula é só do professor, que ele é o único responsável por inserir tecnologia, continuará não sendo inovação. Pergunte, chame seus alunos e diga: ‘quero trabalhar esse tema de um jeito diferente, o que eu posso fazer?’. Eles com certeza terão dezenas de ideias, afinal, eles são os nativos”.

Os nativos offline

“Se alguém me dissesse que eu poderia criar minha escola dos sonhos, ela com certeza teria tecnologia, embora não apenas isso”. Kátia aposta que sim, é possível – e benéfico – alternar momentos online e offline no processo de ensino-aprendizagem com nativos digitais. O essencial é que se respeitem certas características, como o protagonismo, a ação em rede e a criatividade.

A escola ideal da pedagoga teria “dança, música, visitas a museus, estudos do meio, horários para debates”. A avaliação, processual, indicaria caminhos para uma aprendizagem mais personalizada com foco nas necessidades de cada aluno e seria elaborada com o objetivo de gerar reflexão: “Se o aluno consegue responder um exercício com o que encontrou no Google, está copiando, não aprendendo. Com acesso à internet, todo o conteúdo está lá. Qual o diferencial do professor na sala de aula?”, desafia Kátia.

O professor precisa provocar questionamentos, instigar a turma para que relacione informações entre si e com suas experiências particulares, orientar a produção de algo novo a partir daquele conhecimento. Assim, ocorre a aprendizagem.

A neurociência na formação básica de professores

A aprendizagem segundo a neurociência

Para a neurociência, aprender é guardar uma informação na memória de longa duração, de forma que ela possa ser resgatada quando você precisar dela. Entretanto, com frequência, os conteúdos escolares acabam na memória de curta duração dos alunos, que dura de 4 a 6 horas. “Eles estudam para a prova, despejam no papel aqueles dados exatamente da maneira como o professor expôs e, terminada a avaliação, esquecem”.

Como levar o conhecimento à memória de longa duração? Com significado. Se a informação não fizer sentido para os jovens de alguma forma, eles não conseguirão resgatá-la ou conectá-la com outras logo no dia seguinte.


O desenvolvimento biológico influencia a aprendizagem: na adolescência, jovens sentem mais sono e valorizam a opinião do grupo. Como isso pode ser levado em conta na sala de aula?

Entender o caminho que essas informações percorrem até chegar ao cérebro também contribui para práticas pedagógicas que acolham diferentes perfis. “O material da educação é o cérebro do aluno; se eu não sei como esse cérebro se desenvolve, como vou selecionar as melhores estratégias?”, questiona Kátia. Ela explica que a neurociência esclareceu a existência de inteligências múltiplas – dentre elas, visual, cinestésica, auditiva. “Hoje, estima-se que 19% dos alunos tenham inteligência auditiva. Portanto, se o professor só falar em sala de aula, 81% dos estudantes não vão aprender da melhor forma. Se ele usar recursos táteis, visuais, até olfatórios, a aprendizagem é potencializada”.  

A especialista em neurociência ressalta que, acima de tudo, é preciso que o educador tenha empatia pelo momento do desenvolvimento biológico dos alunos – que, sim, também afeta a aprendizagem. “É uma fase de muitas mudanças hormonais; os adolescentes vão crescer entre 40 e 50 centímetros em três anos. Esses hormônios ocasionam oscilações de humor, o que os torna mais chorosos ou agressivos, e mexem no relógio biológico, então eles ficam mais sonolentos”. Para a escola, fica a missão de oferecer aulas mais ativas, interativas e que movimentem a turma como um coletivo – valorizando outra especificidade dessa faixa etária: o novo peso da vida social e da validação do grupo.

Confira o bate-papo na íntegra com Kátia Chedid

Leia mais sobre a pedagoga Kátia Chedid

A partir do mês que vem (julho), a pedagoga e especialista em neurociência Kátia Chedid será colunista no portal InfoGeekie, relacionando mais aprendizados da neurociência ao universo da educação. Você pode enviar perguntas sobre a temática para o email marcela.lorenzoni@geekie.com.br.

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